‘Big Science’ brasileira: workshop debate os possíveis avanços científicos para o Brasil com a Rede de e-Ciência

junho 18, 2025
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O Rio de Janeiro foi palco do primeiro Workshop da Rede de e-Ciência (WReC), evento organizado pela Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) que marca o início de uma nova fase para a infraestrutura digital da ciência brasileira. Durante os dias 17 e 18 de junho, representantes de instituições de pesquisa de ponta se reuniram na sede do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) para compartilhar experiências, apresentar seus projetos e discutir os próximos passos da Rede de e-Ciência, iniciativa executada pela RNP no âmbito do Programa Conecta, investimento governamental para ampliar a conectividade no país e a infraestrutura tecnológica voltada à pesquisa no Brasil.

Com o intuito de acelerar a transferência de dados científicos por meio de uma conexão mínima de 100 Gb/s entre grandes centros de pesquisa no Brasil, a Rede de e-Ciência objetiva se consolidar como uma infraestrutura estratégica para pesquisas que operam com grandes volumes de dados, como astronomia, medicina de precisão, física de partículas, modelagem climática, genômica, simulações computacionais complexas, entre outras.

“Esse primeiro workshop marca o início de uma nova fase da Rede de e-Ciência. Nosso objetivo é fortalecer o engajamento e o sentimento de comunidade entre as instituições participantes, criando um espaço em que possamos discutir de forma transparente os rumos da operação e da governança da rede”, afirmou o diretor adjunto de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da RNP, Leandro Ciuffo.

Ainda na abertura do evento, Iara Machado, diretora responsável pela Rede de e-Ciência na RNP, relembrou a primeira vez que se deparou sobre a necessidade de uma rede de alto desempenho. “Em 2004, não tínhamos nenhuma infraestrutura parecida. Quando conseguimos transferir 1 Terabyte da Uerj para o ponto de presença no Rio de Janeiro comemoramos muito. Por isso, depois de tanto esforço, lançar a e-Ciência e ter tantas instituições de peso como parceiras é a realização de um sonho. É muito gratificante poder apoiar a pesquisa científica e colocar o Brasil em um contexto de colaboração nacional e internacional”, disse a executiva da RNP. 

Para inspirar a iniciativa brasileira em seus primeiros passos, o coordenador da Rede Espanhola de e-Ciência, Ignacio Blanquer, trouxe exemplos internacionais de governança e operação de redes de alto desempenho e como esse tipo de infraestrutura beneficia o ecossistema científico europeu. De acordo com o professor da Universidade Politécnica de Valência (UPV), uma rede de e-Ciência precisa estar intimamente ligada aos níveis estratégicos das instituições participantes e  aos conceitos de ciência aberta. 

“A Rede Espanhola de e-Ciência é um espaço estratégico para reunir contribuições de diferentes atores da ciência espanhola. Mas, por ser um grupo muito diverso, a comunidade não pode impor regras de uso. É necessário colaboração contínua, com a autonomia de cada projeto. A ciência aberta e os dados abertos devem ser sempre o norte para o bom funcionamento da comunidade em torno da rede de alto desempenho”, disse Blanquer. A iniciativa espanhola foi fundada em 2020, com apoio do Ministério de Ciência e Inovação da Espanha.

Atualmente, 17 instituições que atuam com “Big Science” e computação de alto desempenho já foram selecionadas para usar a Rede de e-Ciência, ajudando a impulsionar seus projetos a longo prazo e a fomentar a colaboração científica entre elas:

  • Projeto-piloto (2022 e 2023): Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC); Senai Cimatec; Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC-INPE) e o Centro de Pesquisa da Petrobras (CENPES);
  • 1º edital de adesão Programa Conecta (2024): Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM); Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF); Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Parque Estação Biológica (Embrapa sede); Núcleo de Computação Científica (NCC) da Universidade Estadual Paulista (Unesp); Laboratório Multiusuário de Computação de Alto Desempenho, da Universidade Federal de Goiás (LaMCAD-UFG);  Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
  • 2º edital de adesão Programa Conecta (2025): Instituto Nacional de Cardiologia (INC); Centro de Pesquisa em Medicina de Precisão, da Universidade Federal do Rio de Janeiro  (UFRJ); Instituto Carlos Chagas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz Paraná); Laboratório de Genética Humana e Médica, da Universidade Federal do Pará (UFPA); Laboratório de Computação Científica, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Instituto de Informática, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
  • Instituição convidada: Laboratório Interinstitucional de e-Astronomia (LIneA) 

Experiências e perspectivas: mais eficiência para grandes projetos científicos

Ao longo do Workshop da Rede de e-Ciência (WReC), a comunidade científica compartilhou suas primeiras experiências e perspectivas com o uso da rede de alto desempenho da RNP. Algumas já estão em estágio de execução, mas a maioria encontra-se nos estágios iniciais de implantação da nova infraestrutura.  A expectativa é concluir a fase de implantação até o final de 2026.

Felipe Portella, consultor de Tecnologia da Informação do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), uma das primeiras instituições a usar a infraestrutura da Rede de e-Ciência, revelou durante a conferência o enorme ganho de eficiência na transferência de dados. 

Anteriormente, arquivos com mais de 1 terabyte demoravam horas para serem transferidos. Após o primeiro teste com a e-Ciência, a redução foi significativa. Dentro do projeto de transmissão de dados sísmicos por meio de cabos de fibra óptica submarinos, foi possível transferir, entre o Cenpes e o LNCC, 171 arquivos de processamento sísmico, totalizando 1,7 terabyte, em apenas 39 minutos.

De acordo com o diretor da RNP, Leandro Ciuffo, os primeiros testes estão sendo feitos com uma infraestrutura menor de 10 Gb/s. A partir de 2026, a velocidade mínima de 100 Gb/s já será viável, promovendo ainda mais agilidade e eficiência para transferência de dados entre as instituições científicas aderentes. 

Os relatos de pesquisadores mostram os desafios enfrentados com a infraestrutura atual e a necessidade de migrar para a Rede de e-Ciência. Analista de desenvolvimento tecnológico do CNPEM, Eduardo Coelho diz ser uma situação bastante recorrente em seu dia a dia, apesar dos grandes avanços tecnológicos, o uso de HDs (discos rígidos) para transferir dados entre laboratórios. “Toda semana, temos dezenas de problemas de lentidão na transferência de dados e é muito comum usar e ver pesquisadores carregando discos rígidos”, contou Coelho. 

No CBPF, o gestor computacional da instituição, Marcelo Albuquerque, também mencionou que os HDs físicos ainda são usados como solução paliativa. “Tem casos que não tem rede que aguente para transferir. Usávamos HDs físicos, mas com a e-Ciência, a transferência de dados será viabilizada finalmente com maior fluidez. Montar uma infraestrutura local como esta é essencial para puxar a produção científica brasileira”, concluiu.