RNP se posiciona com relação ao Marco Civil da Internet

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“Em nome da Rede Nacional de Pesquisa, eu agradeço a oportunidade de expressar a opinião de uma parcela da academia brasileira sobre esse estatuto que estamos discutindo.

Historicamente, foi o respeito à dignidade da pessoa humana que nos permitiu resgatar o valor dos direitos à liberdade e à igualdade. Esses direitos, que sempre existiram, hoje são gravados em Declarações das Nações Unidas e em nossa Constituição.

Reflexivamente, talvez, a maior invenção da humanidade para fazer esses direitos tenha sido a Internet. Mais profunda que a imprensa, mais vibrante que a radiodifusão, a rede ampliou a capacidade de inovação. Como? Tornando a igualdade dos usuários um requisito intrínseco de sua arquitetura, que não depende de quem a implanta ou gerencia. A rede é equânime. Não se precisa pedir permissão ao operador da rede para criar uma nova aplicação.

A Internet estabeleceu um novo paradigma de uso, a diversidade das ideias e a interação livre em larga escala. Isso estendeu a comunicação de uma forma absolutamente aberta, permitindo que qualquer fluxo, qualquer contato, não possa ser discriminado, estrangulado, e é cada vez mais difícil, dada a diversidade e a globalidade da Internet.
Portanto, nós apoiamos a proposta com relação a seus importantes aspectos, de direitos de usuários, privacidade, guarda de logs e deveres dos provedores com relação a esse ambiente.

Mas o centro dessa questão reside no fundamento ético dessa equidade, promovido, até o momento de hoje, pela neutralidade da Internet. É a neutralidade que permite o explosivo crescimento da rede. Mas, como vemos no debate do marco civil, pode não ser mais suficientemente geral ou uniformemente admitida em nosso País, caso não consagremos a sua proteção legal.

Srs. Deputados, não se trata de uma tecnicalidade. Estamos aqui tratando de um princípio fundamental, resgatando um valor moral e o inserindo na política do Estado brasileiro, é a valorização do indivíduo que usa a rede em primeiro plano, fazendo-o subordinar ao poder irresistível, seja ele econômico, do interesse privado ou coercitivo, até do próprio Governo.

A RNP foi fundada por universidades, no final dos anos 80, difundiu a Internet no Brasil, criou o primeiro backbone de Internet, em 1992. Naquele ano, juntamente com o IBASE, viabilizou os serviços de correio eletrônico para os delegados da Eco92, no Rio. Cerca de 10 anos depois, interligamos 800 universidades, institutos de pesquisa, hospitais universitários e museus com cerca de 3,5 milhões de alunos, professores e pesquisadores.

A RNP é uma rede neutra. Na linguagem do art. 9º, trata sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicativo. Contudo, seus usuários não colaboram apenas a partir do campus. Hoje, mais do que antes, a educação, a ciência, não se faz de forma isolada. Há inúmeras formas e locais para aprender, além da sala de aula e do laboratório.

Se em casa, na biblioteca da cidade, no café, na empresa ou a meio caminho a rede deixar de ser neutra, geram-se desigualdades e se discriminam oportunidades de educação para todos. Não é oferta de serviços aprimorados ou premium pelos provedores de infraestrutura. Ou seja, há oportunidade de pagar por qualidade que produzirá equidade e inovação. A chamada liberdade de escolha neste caso estará a serviço de uma monetização compulsória e da limitação do uso pela renda do cidadão. Sabemos que a linguagem da rede é o vídeo, mas também sabemos que o gerenciamento técnico e eficiente da rede não requer a quebra do princípio da neutralidade.

Srs. Deputados, neutralidade é igualdade na educação à distância para todos os brasileiros em qualquer local e tempo. Nós achamos que esse marco como está é um enorme avanço para assegurar esse ambiente de educação e crescimento do País. Sua complementação deverá ser realizada utilizando os mecanismos que a sociedade ou o Estado possam desenvolver para a formulação de política de comunicação e aprimoramento da regulação.

A existência de mecanismos de controle social desses direitos, como apontam as experiências de outros países, como os comissariados da privacidade ligados ao Parlamento, poderão instrumentalizar a custódia dessa neutralidade da rede.

Sobre esse desafio, vale a pena terminar lembrando o que ensina o pensador Norberto Bobbio: O problema fundamental em relação aos direitos do homem hoje não é tanto justificá-los, mas protegê-los.

Muito obrigado.”