Efeito colateral

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Por Joaquim Carlos Fanton

A pequena São José do Divino no Piauí está em festa este mês. E não é só pela chegada do mês de junho. No bojo de um ambicioso projeto do governo federal, concebido para levar serviços de banda larga para o interior, entrou em operação um ponto de acesso público, na praça central da cidade.

O cartaz instalado no local informa: “Agora tem internet GRÁTIS na praça”.

Estive lá e vi com os próprios olhos. Quando o sol se esconde e a temperatura fica mais amena, muitas pessoas se dirigem até o local, celulares na mão, e se conectam à internet.

Rede e equipamentos locais foram implantados com recursos do governo federal. Mas a saída para o mundo exterior ficou a cargo da prefeitura. Por se tratar de cidade muito pequena, que representa pouco retorno para os grandes provedores de banda, o máximo que a prefeitura conseguiu foi alugar uma conexão via rádio, com 16 Mb/s. Ou seja, inferior à banda que dispomos hoje em nossas casas e que achamos lenta demais.

Mas parece que ninguém liga para esse pequeno detalhe em São José do Divino. A gente vê no rosto das pessoas a felicidade. É uma alegria só! De graça, a gente toma até injeção na testa, diz o ditado popular!

A meu ver, a maior vantagem é que a cidade possui hoje uma rede óptica própria, interligando pontos de seu interesse. Secretarias municipais, escolas, creches, centros de assistência social, delegacia de polícia, o hospital e o escritório do programa Bolsa Família estão hoje todos interligados e podem trocar entre si gigantescos volumes de informação.

Mas, ao sair para o mundo, terão que compartilhar uma fatia dos 16 Mb/s disponibilizados para todos.

Mas o mais interessante é que todo sistema que inova também desperta maus humores!

O WiFi da praça, por exemplo, está equipado com antena de alto ganho. Embora o contrato estabeleça um alcance mínimo dentro da praça, o sinal chega com força em endereços que ficam a até 200 metros de distância.

Com isso, comerciantes, moradores vizinhos, o dono da farmácia, o dono do supermercado e o gerente da agência dos Correios ficaram felicíssimos. Todos estão pensando seriamente em “descontratar” os serviços do provedor local e migrar para a rede da prefeitura. Num primeiro momento, pelo menos economicamente, o maior prejudicado é provedor.

Mas acabei encontrando, entre os descontentes, alguém que ninguém poderia imaginar: o pároco da igreja de São José, padroeiro da cidade.

Ninguém se lembrou que seu local de trabalho fica de frente para a antena. Sinal cheio dentro da igreja e bancos confortáveis para se sentar. Pode ter lugar melhor para ficar? O padre ficou danado da vida. Estrilou feio!

Li com esses olhos que a terra há de comer o WhatsApp que ele mandou para o responsável pela rede:

– Francisco, você precisa desligar a internet nos horários de missa. Não quero ter que brigar com você!

Na mesma hora, me ocorreram cenas que observo hoje em restaurantes e rodas de amigos. Dei razão à zanga do padre. Os paroquianos, entretidos com seus smartphones, não estão acompanhando direito as missas, nem prestando atenção nos sermões!

A rigor, essa mensagem nada republicana deveria receber um sonoro NÃO. Afinal, apesar do nome da cidade estar associado a um santo, a prefeitura é laica e certamente deve haver evangélicos e ateus na praça durante os horários de missa. Mas fiquei sabendo que a solicitação está sendo devidamente atendida.

Maquiavel escreveu há sete séculos: não existe atividade mais perigosa e, ao mesmo tempo, mais frustrante do que trabalhar em inovação. O inovador precisa conviver com a indiferença dos futuros beneficiados e enfrentar o ódio daqueles que inevitavelmente se julgarão prejudicados!

 

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